J. Antônio Cirino*
Estabelecer processos que contribuam para uma comunicação efetiva é fator essencial na prestação dos serviços de saúde. Falhas no fluxo comunicacional são comumente enfrentadas pelas unidades de saúde, mesmo no ambiente intra-hospitalar, que, de um modo geral, é um espaço controlado de perto por equipes assistenciais e administrativas. Esse cenário torna-se ainda mais desafiador quando o cuidado é ofertado no lar do paciente, em que não existem equipes em tempo integral fisicamente ao lado dele, dificultando, por vezes, o controle e o gerenciamento das diversas situações possíveis. Quando atuamos para a melhoria da comunicação, há maior fluidez e conexão entre os envolvidos no cuidado, mitigando os riscos.
A atenção domiciliar traz consigo características ímpares ao compararmos o processo de comunicação paciente-profissional, visto que este se encontra em seu ambiente natural, diferentemente de estar internado em um hospital. Em casa, o paciente pode se sentir mais à vontade para comunicar seus anseios, desejos, dores e participar mais ativamente do seu plano terapêutico. E, quando da ausência desta possibilidade, os familiares, mais próximos de todo o cuidado prestado, conseguem tornar-se protagonistas desta jornada, fazendo-se presentes por mais tempo.
Para que todos os benefícios inerentes ao cuidado em casa possam ser potencializados com foco principal na continuidade da assistência, a instituição prestadora pode estabelecer e gerenciar um protocolo de comunicação efetiva, visando nortear a atuação da equipe com relação à comunicação paciente-profissionais, família-profissionais e profissionais-profissionais. Esta estruturação atende a uma das metas básicas de segurança do paciente promulgadas pelo Ministério da Saúde (MS), com foco na melhoria da comunicação para um cuidado ainda mais seguro.
Na perspectiva da relação dos profissionais com o paciente, espera-se, minimamente, a comunicação clara e constante de cada procedimento a ser executado, com a ciência e a concordância do assistido, bem como o esclarecimento detalhado de dúvidas acerca de seu estado de saúde e da terapêutica em andamento. Isso também deve ser empreendido com os familiares, tentando padronizar mecanismos para garantir que a informação chegue a todas as partes interessadas, por algum meio pactuado com eles.
Já na comunicação efetiva entre profissionais, no âmbito da atenção domiciliar, o registro em prontuário é parte fundamental da estratégia de continuidade do cuidado. Um registro claro, coeso e objetivo oportuniza melhores legibilidade e efetividade no próximo plantão. Isso pode ser reforçado ainda com algum instrumento específico de “passagem de plantão” para o próximo profissional, com critérios diretos do que o colega do turno seguinte deverá observar com mais atenção. A construção de checklists é uma das soluções para garantir que as etapas de cada procedimento sejam executadas, oportunizando um acompanhamento conjunto com o paciente e o familiar.
“Ainda no campo da comunicação, é dever do profissional da AD [atenção domiciliar] envolver e corresponsabilizar o usuário e o cuidador/família, na medida de suas possibilidades, na elaboração do plano de cuidados de forma compartilhada […]”, realizando, assim, a conexão essencial entre os envolvidos, unificando as estratégias de cuidado neste planejamento que será seguido e acompanhado por todos.
Assim como outros protocolos, o de comunicação efetiva também precisa ser gerenciado, estruturando métricas de acompanhamento de sua realização. Alguns pontos podem ser verificados, como a adesão ao protocolo, pela análise do adequado preenchimento das comunicações escritas; avaliações in loco por parte da gestão para evidenciar que os passos para uma boa comunicação oral estão sendo seguidos; uma autoavaliação dos profissionais quanto ao plantão anterior, para analisar se foram obtidas as informações necessárias para a continuidade da assistência; entre outros quesitos essenciais para o acompanhamento.
Na atenção domiciliar, estruturar práticas de controle para uma comunicação efetiva proporciona um gerenciamento adequado dos riscos que podem decorrer de uma falha nesta relação entre os envolvidos. Isso propiciará um cuidado mais seguro e uma maior satisfação dos pacientes e dos familiares, por conseguirem as informações que são importantes e desejáveis, com significativa redução da ansiedade. O tratamento assistencial é mais bem recebido, ao passo que solidifica um vínculo entre profissional e assistido. Assim também o é para com os profissionais prestadores do cuidado, que executam suas atividades com probabilidade menor de falhas.
* Comunicólogo, gestor de qualidade, professor e pesquisador, atuando desde 2009 na área da saúde. Autor do livro “Gestão da comunicação hospitalar” e coordenador científico do Manual do Gestor Hospitalar, volumes 1 e 2, da FBH.